sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Estimulação sensorial

Madagascar III:
Europe's Most Wanted

(farsa,
USA, 2012),
de Eric Darnell, 
Tom McGrath
e Conrad Vernon.


= = =
por Marcelo Hessell
Omelete/2012

No meio do escuro só dá pra ver pequenos pontos de luz e Julien, o Rei Lêmure, está com medo. Basta um lambuzado beijo de língua de urso, porém, e Julien se solta, o breu se torna um show dançante de estímulos sensoriais. Se os filmes de Madagascar funcionam como viagens de ecstasy para crianças, esse Madagascar III: Europe's Most Wanted, com suas muitas luzes e seus muitos suores, é o mais próximo que elas vão chegar de uma rave.

A trama envolve novamente o desejo do leão Alex e seus amigos de voltar ao zoológico de Nova York; a ideia agora é seguir um circo itinerante na Europa que tem a promessa de excursionar pelos EUA. A principal novidade na franquia, porém, está no formato 3D. A DreamWorks pediu consultoria a Guillermo Navarro (diretor de fotografia vencedor do Oscar por El Laberinto Del Fauno [2006]) na estereoscopia e faz de Madagascar III um tiroteio constante de coisas tela afora, em direção ao espectador.

Se manter interessada a garotada com déficit de atenção é um desafio para os contadores de história hoje em dia, a solução encontrada pelo filme não poderia ser mais fácil: interromper uma “história” na metade e “começar outra”. Então, enquanto Alex e Gia conversam no primeiro plano, alguém lá do fundo do quadro dispara uma bala-humana entre os dois (que ao ganhar a prioridade do olhar passa a ser “outra história”). O mesmo se repete quando Melman e Gloria estão sobre a corda-bamba, também conversando, e outra bala-humana avança pra fora da tela. Madagascar III trata a contação de histórias tradicional como um jogo perdido — a única maneira de vencer, hoje, é contar (ou arremessar) várias ao mesmo tempo.

Essa estratégia da saturação se estende aos efeitos sonoros (carros batem em coisas e fazem barulho de pinos de boliche) e aos elementos visuais distribuídos na tela (pouca gente vai perceber, mas o skyline de Nova York já tem as novas torres do WTC, que sequer estão terminadas na realidade). Nesse sentido, poucas coisas combinam tanto com Madagascar quanto o circo, cuja imagem principal é a do picadeiro repleto de atrações simultâneas, das focas equilibristas ao carro lotado de palhaços, roubando atenção umas das outras.

Enquanto você, pai de família, não precisa se preocupar com os gastos com Rivotril que seu filho terá no futuro para controlar tanta ansiedade gerada por anos de hiperestímulos, repare como os personagens de Madagascar III realmente reagem aos excessos como se estivessem chapados: perdendo líquidos. É o leão marinho que não para de chorar, é a salivação do urso engolindo o lêmure, são os perdigotos descontrolados sempre que um bicho fica de frente com outro. A imagem do tigre que se lambuza de azeite pra atravessar o círculo de fogo sacramenta o negócio — Madagascar III é a maior suadeira.

Então a melhor recomendação que se faz aqui, por enquanto, é a mesma que se dá antes das raves: não esqueça de se hidratar.
 
= = =

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