quinta-feira, 31 de julho de 2025

Regras de etiqueta

Caindo na Real

(farsa,
BRA, 2024)
de [ ].



por Paulo Ayres

Quando aparece a bandeira do Brasil imperial, Caindo na Real revela qual é seu principal objeto satírico no texto direto. Ou melhor, o objeto é o significado dessa bandeira hoje entre os saudosistas que se organizam politicamente. No ritmo acelerado da farsa, o golpe aristocrático já ocorre no começo da trama e a procura pela descendente de Dom Pedro II leva o governo até Tina (Evelyn Castro). O dilema do novo período monárquico brasileiro toma a forma de uma sátira sobre regras de etiqueta para uma chapeira do Rio de Janeiro. Do podrão ao trono.
 
Como articulador maquiavélico, Alaor Ribeiro (Maurício Manfrini) é o homem do Partido Monarquista que conduz essa transformação política como fachada de culto de personalidade. Por trás do espetáculo da burguesia de sangue azul, o sistema continua em suas linhas essenciais. Trabalhadora culinária, Tina se preocupa com os indicadores sociais que apontam fome e má nutrição no país. O filme estabelece a maioria das piadas sobre rituais da nobreza como estranhamento aos olhos modernos. É compreensível que as concepções políticas gerem divergências entre si, mas a defesa de realezas é difícil de entender. Ou, talvez, não é algo tão estranho no contexto do capitalismo tardio.

Na corte da rainha do Brasil há algumas participações especiais, como o mordomo feito por Carlos Moreno — marcado como garoto propaganda da Bombril — e a repórter feita por Cissa Guimarães. Além disso, há a presença do cantor Belo como Barão, o par amoroso da protagonista. Contudo, ainda que haja canções originais, inclusive pagode, o romance que chama mais a atenção é o que é conduzido por Maria Clara Gueiros. São códigos de sátira edificante: o casal principal recebe os holofotes padronizados, enquanto alguns coadjuvantes podem ser modelados e remodelados de forma mais inesperada.
 
Caindo na Real é sobre regras de etiqueta e ética política. Isso permite uma reflexão sobre esses complexos sociais. Se a etiqueta é a pequena ética, essa ética é uma grande etiqueta. Os códigos de ética, em sentido amplo, são éticas idealistas: ética política, ética religiosa, ética profissional, ética empresarial etc. São mediações necessárias nessa forma de sociabilidade, mas possuem certa insuficiência e descompasso. 
 
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