domingo, 8 de junho de 2025

Hierarquia urbana

Dog Man
 
(farsa,
USA, 2025)
de Peter Hastings.
 

por Paulo Ayres

Em certo momento do filme Standy by Me (1986), os quatro meninos que se embrenham no mato, sentados, conversam sobre assuntos variados. Uma questão emerge: que diabos é o Goofy? Eles ficam em dúvida sobre qual animal antropomórfico é o personagem conhecido como Pateta no Brasil. É algo referente a uma questão que já virou piada e meme. O Pluto também é um cachorro no multiverso Disney. A resposta é aquilo mesmo que se nota: Goofy é um cachorro antropomórfico e o Pluto faz parte das criaturas que não são nesse mundo — embora, pelo contexto satírico, o animal pode apresentar uma inteligência maior que o da nossa realidade. Em Dog Man essa diferenciação salta aos olhos.

Na cidade da sátira animada, após um acidente envolvendo um policial e seu cão, uma cirurgia conecta o que resta de aproveitável dos dois: a cabeça de cachorro e o resto do corpo humano. Surge o Dog Man, um combatente do crime que tem um organismo híbrido. A postura de homem, mas às vezes com comportamento canino e sem falar uma palavra, apenas latir e uivar. Acontece que a farsa de Peter Hastings coloca um gato laranja antropomórfico no papel de arqui-inimigo, Petey (voz de Pete Davidson). Ele introduz, ainda, através do felino, o tema da paternidade e da amizade como foco da narrativa. Entre planos e invenções mirabolantes, Petey cria um pequeno clone de si mesmo. Além de um tipo de herói, Dog Man se torna o pet do “filho” do vilão. Nesse estranho triângulo social está a ordem, a desordem e o afeto entre os animais antropomórficos “naturais” e o servidor, que também é um bicho de estimação. Dog Man avança um patamar ôntico de complexidade, mas não totalmente para estar no nível comum dos cidadãos.
 
O processo de antropomorfização não para no dilema do protagonista. Torna-se um componente insistente no enredo. Um peixe, Flippy (voz de Ricky Gervais), assume o papel de vilão e adquire a capacidade de transformar os prédios do centro urbano em criaturas vivas e andantes.
 
Obra derivada de Captain Underpants: The First Epic Movie (2017), Dog Man é o mais recente longa da DreamWorks. Mais ou menos como RoboCop (1987), a animação farsesca é sobre um cadáver (ou quase) da classe servidora que é reutilizado em parte pela força policial do município. Diferente da sátira realista de Paul Verhoeven, na sátira edificante de Hastings o protagonista termina com uma família nuclear.
 
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