segunda-feira, 3 de março de 2025

Transporte niilista

Zombeavers
 
(comédia,
USA, 2014)
de Jordan Rubin.
 


  por Paulo Ayres

Antes de entrar no corriqueiro clima de pesadelo referente ao horror e alta tensão, como uma sensação de cerco fatal — no caso, uma cabana distante perto de um lago atacado por castores zumbis —, Zombeavers abre e fecha com uma dupla de transportadores de produtos tóxicos, nem tanto distraídos, e sim absorvidos em certa conversa de banalização extrema, indicando uma indiferença irônica. Ok, é engraçado como eles falam de coisas íntimas, sobre putaria e escatologia, de maneira blasé. O grande problema da eco-comedy de Jordan Rubin é que ela não dosa esse recurso, extravasando paulatinamente no enredo até deixar tudo no mesmo nível anestesiado que há nas pontas do início e do fim.
 
Se bem que, desde o começo com o núcleo juvenil, percebe-se uma espécie de ousadia em diálogos, não estava claro que se tratava de um trajeto de apagamento sanguinolento fechado em si mesmo. As três moças chegam primeiro ao lugar. Depois os três rapazes são inseridos como pares de cópulas. Besteiras à parte, todos aparentam ser jovens saudáveis com a vida sexual constante — contraste com os animais mortos-vivos. Um ponto que já subverte a velha tendência da final girl virgem. Por outro lado, com os acontecimentos que desabam a estadia, gradualmente descobrimos que não há protagonista propriamente dita, a trama estende demais sua gana subversiva e extrapola o horror da contagem de corpos.
 
A ficção científica assume o piloto automático. Em certo período, entretanto, surgem elementos contendo potencial de bom desenvolvimento. Uma mudança de casal, por exemplo, termina com a zumbi loira se vingando da traição de maneira hilária. Ou talvez já nem se tratava de vingança, já que, em meio à angústia generalizada, ela disse relevar. É essa indiferença e automatismo que cresce entre a turma e a deixa, mais ou menos, no nível artificial dos bonecos animatrônicos. Essa encenação comediesca abusa do visual capenga dos castores carnívoros, ao estilo de um bicho empalhado puxado com cordinha. Isso aí, pelo menos, não é um problema nesse contexto.
 
É na afirmação de uma sátira niilista que o referido pesadelo metafórico não se encerra propriamente; antes é atropelado pelo transporte da indiferença. Algo distinto do final de Scary Movie (2000), sátira realista em que o atropelamento se dá numa farsa metalinguística (não fatal) e afirma o plot twist com um casal inesperado e golpista que engana a cidade.
 
É possível haver uma associação de aparência e simbologia da figura dos castores com o trabalho, pois eles transportam madeira e constroem um dique natural. No entanto, não se trata da atividade material humana, que possui uma interação intencional no sentido teleológico. E Zombeavers é o tipo de filme em que o ser social em questão parece não ter saída de um determinismo macabro.
 
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Lista de sci-fi comedy no subgênero eco-fiction:
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