Joker: Folie à Deux
(tríler,
(tríler,
USA, 2024),
de Todd Phillips.
de Todd Phillips.
por Paulo Ayres
Quando Todd Phillips apresentou seu drama realista baseado no universo DC em 2019, o grau de objetividade cênica da Gotham City está tão acentuado que os elementos simbólicos formam uma unidade sólida na teia de significações. É tão simples e tão complexo ao mesmo tempo que Joker, o personagem, e Joker, o filme, expressam uma jornada de transformação de um indivíduo com a saúde mental perturbada se sintonizando com o ambiente, havendo até uma modificação na aparência externa do dito cujo, uma mudança performática e na interação com meio urbano. O aspecto é bem geográfico e as cenas e elementos que representam devaneios estão bem delineados ou esclarecidos posteriormente; isto é, uma provável exceção que deixa dúvida sobre o grau de realidade é a celebração perto do fim, no meio de uma insurreição anarquista — o espontaneísmo é o fetiche da espontaneidade política das massas.
Joker: Folie à Deux é lançado cinco anos depois com evidentes intenções subversivas, até um tanto metalinguísticas — como o fato de dizer que os acontecimentos criminais passados resultaram num filme que fez de Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) alguém famoso e, por isso, muitos nutrem expectativas, que podem ser entendidas também como expectativas cinematográficas. Nesse movimento subversivo da narrativa planejada e executada, o passo além foi borrar as fronteiras entre objetividade e subjetividade na trama. Não de maneira completa: os números musicais ainda podem ser entendidos como delírios, ilhas subjetivas, mas os acontecimentos em certas sequências demonstram uma integração direta que, pelo significado e recorrência, afirmam uma ficção de fantasia.
Desde o período da pré-produção, em que se anunciou que a continuação seria um musical, muitos torceram o nariz e até é compreensível ficar com o pé atrás. Antes de tudo é preciso reconhecer a estranheza do projeto. Trata-se talvez do único tríler mágico-musical que se tem notícia — e aí estou supondo o pioneirismo nesse aspecto.
Arriscado, mas Joker II consegue ser ousado na medida certa. Phillips recria toda a atmosfera opressiva do filme anterior e injeta nele momentos líricos, abrindo um horizonte de vitalidade para Arthur. E, diferente da dualidade de personalidade do protagonista, que é a temática principal, essa divisão concreto-fantasiosa da trama se mostra unitária, havendo até delírio musical com uma violência forte assumindo o retorno das angústias do tema principal.
Se, mais do que nunca, Arthur/Joker é o centro do texto e subtexto, qual é o papel da Harley Quinzel de Lady Gaga gravitando em torno dele? Bem, ela representa uma tendência de afirmação psíquica de resgate em meio à passividade de paciente medicado do Arkham. Deste modo, o enredo vai além do clichê do amor romântico transformando a vida de um celibatário involuntário, pois essa forma de afetividade se mostra tão assertiva que passa a ser agressiva. O tiro simbólico é evidente em suas intenções. Joker: Folie à Deux é um drama realista de amor.
Assim como a animação farsesca do início, Phillips também coloca sua
continuação ousada como uma espécie de sombra que persegue o rastro de
um filme de grande sucesso. Mais do que isso, esse tríler se funde em
coerência de realidade com o anterior. Alguém pode ter observado como o
ato de tirar Joker, o personagem, de um pedestal que supostamente ele
teria ficado na obra anterior, porém ambos os filmes mostram ele
sucumbindo ao sistema e desabando psiquicamente no desfecho. Seja
encarcerado ou esfaqueado. Antes disso, por outro lado, Joker, como
advogado de si próprio, incorpora a responsabilidade e significa uma
nova elevação, outro crescimento individual. Mas, tal como
anteriormente, a figura do ex-amigo Gary Puddles (Leigh Gil) demonstra que ele reprime a compaixão, não deixando uma dose dela fluir dialeticamente na sua postura, No comportamento binário (vulgo bipolar) desse indivíduo, a divisão mecânica extrapola a assertividade para a agressividade extrema. Independente se Lee se encanta com os limites cada vez mais transgredidos — afinal, ela é uma “doida” fascinada pelo crime —, a ruptura do relacionamento indica também a instabilidade e a quebra de admiração na forma imatura de amor sexual que predomina na nossa sociedade e estrutura a maioria das famílias nucleares.
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