por Paulo Ayres
Há um meme que ironiza aquela frase que diz que podem tirar tudo de você, menos o conhecimento que você aprofunda com o tempo. Logo abaixo, o “Alzheimer” olha desconfiado em direção de quem vê a imagem. Robot & Frank é uma dramédia sobre confiança e desconfiança em olhares sutis e tecnologia de ponta. No título do filme, a dupla, formalizada com o conectivo, possui primeiro a referência ao robô humanoide (voz de Peter Sarsgaard). Depois está o nome da pessoa, Frank (Frank Langella), o idoso que vive sozinho e está com vários lapsos de memória. Seja qual for a intenção dos realizadores, há um apontamento irônico do protagonismo da ficção e da vida cotidiana da residência retratada.“Robot & Frank” é a dupla da terceira idade numa unidade de opostos. Os numerais aí são ilustrativos: 2, 3, 1... O par amoroso com Jennifer (Susan Sarandon) está deslocado. Há o papel de pai visitado por dois filhos, Hunter Weld (James Marsden) e Madison Weld (Liv Tyler), preocupados com sua saúde e com opiniões distinta sobre a máquina.
Da mesma forma que aquele “astronauta bastardo” — parecido com o robô real Asimo da Honda — gera mudanças de perspectivas entre a confiança e a desconfiança, a dupla principal, ironizada desde o título do drama, possui uma conexão cada vez mais fluente que, com o desenvolvimento narrativo, mostra que não é uma ironia com a demência ou algo do tipo. Trata-se de um reconhecimento humanista das limitações orgânicas e psíquicas, pois indica ontologicamente Frank como a esfera mais complexa. O humanismo abstrato de Robot & Frank destaca Frank no aspecto ativo de coordenação de trabalhos ilegais, planejando a execução de furtos cada vez mais elaborados.
E o trabalho material realizado pelo robô no âmbito doméstico? Pois bem, o drama edificante deixa em aberto a questão sobre quem é o executor de tais atividades. Não há confirmação se aquela máquina está no patamar de interação intencional do ser social — em algumas ficções científicas está, em outras, não. Ademais, suponhamos que é o caso de uma emergência ôntica em que o salto de qualidade pode ser caracterizado como uma inteligência com intenção própria. Então, a techno-dramedy também cria uma dimensão de ironizar, metaforicamente, a exploração do trabalho alheio. Robot & Frank está bem servido de observação de comportamentos em determinado contexto histórico. Funciona bem, tanto na leitura de que é um amigo real, quanto na leitura de que é apenas um eletrodoméstico e simulação avançada que auxilia no cuidado cotidiano.
Depois de furtos de pequenos objetos, joias, causando prejuízos para um burguês (Jeremy Strong), e assustar a polícia com a aparência de autodestruição programada, Frank repousa na afetividade familiar e na casa de repouso. O livro roubado é Don Quixote de la Mancha (1605/1615), dramédia de Miguel de Cervantes, e outros escudeiros terapêuticos surgem na tela.
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Lista de sci-fi dramedy no subgênero techno-fiction:
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