por Paulo Ayres
Terceiro e último drama que Paul Verhoeven fez nos Estados Unidos, Hollow Man é uma despedida transparente, um experimento audiovisual de pouco reflexo. Sem contar Flesh and Blood (1985) — um filme mais europeu do que estadunidense —, o terceiro drama hollywoodiano do diretor holandês não acompanha a densidade de Basic Instinct (1992) e Showgirls (1995), muito menos está no nível da sua trilogia satírica: RoboCop (1987), Total Recall (1990) e Starship Troopers (1997). Embora Hollow Man também seja uma ficção científica, nota-se que é algo bem distinto dos três folhetins. É uma diferença na superfície formal, pois Hollow Man tem uma encenação dramática, mas também é uma diferença de conteúdo: o tema da invisibilidade gera, irônica e infelizmente, um espelhamento embaçado.
Sebastian Caine (Kevin Bacon), o homem invisível da trama, é enfatizado com uma personalidade arrogante, e além disso, o texto direto já indica que não quer fazer uma reflexão sobre a natureza humana (segunda natureza). O roteiro, também, assume certa desconexão com a sociedade capitalista e a hierarquia política, fazendo da equipe de cientistas um confinamento que está agindo nas sombras não autorizadas do Pentágono. Pronto; um palco enclausurado e de vigilância cotidiana é montado. E isso até está em sintonia com uma proposta trileresca e sua inclinação sutil, mas não é o que ocorre. Como se tentasse compensar a possível monotonia de uma experiência científica, um leque de recursos visuais e sonoros se abre de maneira precoce com o desenvolvimento. Na reta final, então, chega-se ao cúmulo de assumir a estilo narrativo de body count. Uma contagem de cadáveres não só sanguinolenta como (auto)destrutiva.
A cobaia humana que se voluntaria para aplicar em si mesmo o soro da invisibilidade, Sebastian, muda o subgênero ficcional de um possível eco-thriller — há experiências com animais como cachorros e símios — para o techno-thriller. Ele é o foco temático que a câmera de Verhoeven busca acompanhar via efeitos visuais com lençol, máscara de látex, fumaça, água, sangue, fogo... Em outros momentos, há uma apresentação anatômica do desaparecimento por camadas, com tecidos, sistemas orgânicos e esqueleto. Acompanhamento que também está no enredo do drama edificante, especialmente feito pelo casal de cientistas Linda McKay (Elisabeth Shue) e Matthew Kensington (Josh Brolin).
Alguma tensão erótica e crimes sexuais até poderiam emergir o tema das relações patriarcais, mas, no contexto, são momentos tensos soltos. Sebastian assedia as mulheres da equipe científica e, quando sai invisível pela primeira vez, estupra a vizinha do prédio ao lado. O cientista maluco diz que é incrível o que se pode fazer quando não precisa olhar seu próprio reflexo no espelho. O espelho envaidece e, também, intimida. Hollow Man, na sua tosca seriedade, pode ser entendido também como um soro da visibilidade vilanesca.
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Lista de sci-fi thriller no subgênero techno-fiction:
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