por Paulo Ayres
Conhecido como um dos cineastas estrangeiros que têm a oportunidade de dirigir superproduções em Hollywood, Alfonso Cuarón é autor de Y Tu Mamá También. Película mexicana tão simples quanto profunda porque cria uma situação ficcional repleta de banalidades e encontra aí um humanismo concreto em conexões temporárias. No entanto, em certo olhar apressado, pode gerar dúvidas quanto às intenções estéticas do filme. Pornô chique de festival? As cenas de sexo são bem simuladas para parecer coitos reais e espontâneos. Elogio fácil da juventude hedonista? Nada disso. Há uma aproximação irônica da narrativa com os personagens e, entre uma conversa descontraída e outra, o México rural surge na tela. Contrastes com o interior do veículo bem pensados por Cuarón. Em resumo, não se trata de um filme de estrada petulante com um carpe diem conciliatório.
O que primeiro chama a atenção na narrativa é o uso de um narrador em terceira pessoa na voz de Daniel Giménez Cacho. Como se fosse pausas de literatura, essa narração onisciente intervém às vezes, parando o som e gerando um afastamento em que as situações singulares são inseridas num panorama mais abrangente. Assim como a visão da pobreza no interior do país, esse recurso impede que o escapismo, demonstrando pelos protagonistas, domine totalmente o sentido do relato audiovisual. A viagem se desenvolve como um desvio, um rito de passagem significativo. Tão intenso quanto a atração momentânea do trio é seu movimento de separação.
Os grandes amigos Tenoch Iturbide (Diego Luna) e Julio Zapata (Gael García Bernal) estão na transição do colégio para a faculdade e conhecem a esposa espanhola do primo de um deles, Luisa Cortés (Maribel Verdú). Depois que o marido confessa uma traição, ela aceita o convite dos garotos para viajar para uma suposta praia paradisíaca. No percurso, Luisa fica sabendo que eles batizaram, e sistematizaram em mandamentos, um estilo de vida anarquista. É uma daquela viagens que explicitam contradições e imaturidade, mas também eleva um núcleo de crescimento afetivo. Nisso é parecido com muitos filmes de estrada como jornada de autodescoberta. O filme de Cuarón, porém, é um vaivém de contatos sem sermão ou sacrifício redentor. Inclusive, nem é o narrador de tom jornalístico que fala sobre o câncer terminal, mas um dos meninos, na última vez que se encontraram em suas vidas.
Por exemplo, a dramédia americana Winter Spring Summer or Fall (2024) é sobre jovens nessa faixa etária, havendo até dois casais realizando uma viagem de carro. A comparação de filmes é válida, pois mostra os estilos diversos de falar sobre conexões e rupturas na juventude. Bem diferente desse drama edificante, Y Tu Mamá También começa escancarado na intimidade sexual de dois casais amigos, na reta final da adolescência. As namoradas viajam para a Itália. Os jovens pequeno-burgueses iniciam um processo de mudanças nas suas relações sociais, mesmo sem ter uma consciência clara disso. A viagem à praia, em juízo posterior, marca o início de novas dinâmicas em cada vida cotidiana. Uma suspensão e um retorno em espiral, em novo patamar.
Como pano de fundo da ficção histórica, uma passagem relevante na história mexicana: depois de sete décadas no poder, o PRI perde a eleição presidencial. O drama realista introduz essas observações mais amplas, embora cumpra sua função de espelhamento através das vidas específicas do trio.
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Lista de historical dramedy no subgênero fiction of manners:
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