sexta-feira, 26 de setembro de 2025

Órbita elíptica

 The Fantastic Four:
First Steps 

(folhetim,
USA, 2025)
de [ ].
 

por Paulo Ayres

O universo de The Fantastic Four: First Steps não chama a atenção apenas pelo visual de futurologia retrô, mas também por ser uma proposta de rebranding inicialmente fechada na chamada Terra-828. Isto é, com exceção de um aviso nos pós-créditos, a obra se diferencia da tendência recente de expansão referencial.

Na verdade, o folhetim de [Matt Shakman], curiosamente, faz referência num televisor e se mostra influenciado pelo desenho animado The Fantastic Four (1967-1968). O que chama a atenção é que aquele folhetim televisivo é de um universo da Hanna-Barbera, que foi comprada pela Warner e ainda rende ficções, como o filme recente Scooby-Doo! and Krypto, Too! (2023) — é o universo que contém a turma do Scooby e similares, além de super-heróis próprios como Space Ghost e uma versão própria da Liga da Justiça, Super Friends (1973–1985). O filme The Fantastic Four: First Steps é apenas parecido com aquele outro mundo, sendo um episódio com ares de item autônomo, mas parte de outra fase de conexão da Marvel.
 
A sátira edificante comenta a origem dos superpoderes do quarteto via exposição espacial, mas estabelece, desde o início, uma ambiente urbano em que o grupo é exaltado como se formado por celebridades. Pela leveza que vai da fotografia até certos detalhes de figurino, o clima criado é de uma fama ao estilo de The Beatles de 1964. Há, inclusive, um programa televisivo com a aparência de ser algo como The Ed Sullivan Show. Franklin, o bebê que é filho de Reed Richards (Pedro Pascal) e Sue Storm (Vanessa Kirby), é o pivô de desenvolvimento do enredo. Ponto que irradia o tema do conflito entre os interesses de uma família nuclear e a sociedade (no caso, mundial). O dilema traz a questão do sacrifício redentor para o primeiro plano, embora não o conclua de maneira trágica. Tanto o bebê quanto a Mulher Invisível sobreviverão ao clímax de destruição parcial da cidade feito por Galactus, a entidade espacial devoradora de planetas.
 
Em certo sentido, First Steps é como a contradição de uma órbita elíptica, num movimento de aproximação e distanciamento. Sabemos que inaugura uma nova fase e irá abrir o horizonte com Avengers: Doomsday (2027), mas ainda não ocorreu. Na sua autonomia relativa, a estilização cenográfica gera uma distinção considerável com o que estava sendo feito. Até o momento, é mais diferenciado do que o projeto de reboot anterior que foi um fracasso comercial: Fant4astic (2015). First Steps é, provisoriamente, um filme "solto" de propósito, para ser acoplado em breve. Desta vez sem linhas tortas, é um caminho de unificação visto em Spider-Man: No Way Home (2021), que juntou três versões do Homem-Aranha: quando o Peter Parker que é feito por Tom Holland, e tem a Marisa Tomei como Tia May, encontra os personagens interpretados por Tobey Maguire — a trilogia Spider-Man (2002–2007) de Sam Raimi — e por Andrew Garfield — dos filmes de Marc Webb, The Amazing Spider-Man (2012) e The Amazing Spider-Man II (2014).

No papel de intermediária entre Galactus e o planeta escolhido, surge uma Surfista Prateada (Julia Garner?) que até será atormentada pelo remorso, mas não desenvolve laços mais profundos com o grupo principal. Falta uma interação alienígena mais intensa em First Steps como ocorre na trilogia Guardians of the Galaxy (2014–2023) - estirpe espirituosa do MCU na cadência da trilha sonora retrô e dirigida por James Gunn. No entanto, como foi observado, o pedestal e a assepsia em First Steps estão friamente calculadas como plataforma interessante de exploração visual e narrativa. Nesse sentido, realiza um bom contraste com outro filme "solto" da Marvel: The Punisher (2004), de Jonathan Hensleigh. Um folhetim criminal sobre a formação inusitada de uma “família” num muquifo enfrentado gangsters de uma família rica. No caso do núcleo familiar da Future Foundation, há uma presença discreta dos "tios" Human Torch (Joseph Quinn) e Thing (Ebon Moss-Bachrach).

Se os folhetins Captain America: Brave New World (2025) e Thunderbolts* (2025) encerram a quinta fase do megaprojeto, First Steps aponta uma nova reconfiguração que se afasta um tanto da trajetória cinematográfica anterior. Mas, ao que tudo indica, sem escapar de certa rotação do passatempo de qualidade e previsível.
 
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